sexta-feira, 18 de março de 2011

porquê.


Porque o imaginável é sempre mais apetecível do que a realidade, tendo como única explicação e razão o facto de ser sempre mais perfeito do que o cenário real mais próximo que se possa arranjar. E porque envergamos e depositamos todas as nossas mais frenéticas expectativas em histórias tiradas das mais atraentemente loucas e aliciantes imagens de partes incertas. E porque se o mundo fosse visto como é, e mesmo dissimulado não deixa de o ser, não haveria oxigénio suficiente que se segurasse nos pulmões mas manter uma única alma viva; usando como chave para a sobrevivência a ilusão e a imaginação, quando nos deparamos com a realidade ao nosso lado, inventamos uma desculpa para a desacreditar ou viramos somente a cara fingindo nada estar ali, diante os nossos olhos, assim como fazemos quando vimos alguém que é (ou não) necessitado que requer a nossa contribuição. E porque vivemos de revoltas quando na verdade, simplesmente nos fartamos da rotina que é ter sempre a mesma coisa, mesmo sendo escolhida meramente e livremente por nós, arranjando e movendo mundos e fundos para a alterar, repelindo-a, difamando e falseando até mesmo o nosso próprio ser. E porque vivemos da necessidade de que algo esteja errado, procurando incessantemente pelo problema, dizendo, no entanto, que paz e sossego é tudo aquilo que procuramos e ansiamos. E porque os “clichés” só o são porque de uma genuína forma resultam, por muito que digamos que são cansativos e ordinariamente banais sonhamos com os mais repetitivos “clichés” em determinados momentos da vida. E porque aquém do que remodelamos em nós num percurso de vida, mudamos por um alguém, quando o teoricamente suposto seria não nos alterarmos, encaixando quase perfeitamente com “o/a tal”, tentando inconscientemente ser o alguém que esperam de nós, com um involuntário medo de nos vermos sozinhos, pelo mundo. E porque reinventamos um sentido para a vida ou para nós próprios, com alternância de fases, nas quais somos ignorantemente felizes, nas quais ganhamos, posteriormente, uma viagem grátis pelo frente-a-frente com o mundo num décimo do que é e num nonagésimo do que achamos ser, ou gostariamos que fosse, sofrendo de qualquer maneira com isso (de uma forma que só numa estabelecida idade sabemos fazer), e para colmatar agimos como os chamados malucos que não se interessam minimamente pelo que os outros matutam ou pelo que aparentamos ser. E porque criamos mapas que (hipoteticamente) impedem que nos percamos quando os descobrimentos foram/são as melhores histórias pelas suas vigorosas e inesperadas encruzilhadas. E porque façam o que fizerem ou digam o que disserem há coisas que nunca se irão transformar, porque a sociedade, melhor dizendo a humanidade, não precisa de mudar ou alterar alguma coisa, mas sim de uma transformação, lavagem cerebral ou mesmo de uma intensiva mudança no meio, em que apenas as pessoas “de jeito” sobreviveriam reproduzindo-se, estas, mais do que as outras, havendo assim uma selecção natural acabando com algumas derradeiras personagens. E porque independentemente está tudo relacionado, não havendo salvação possível, havendo uma violenta luta pela tal inexistente salvação, onde só “os melhores” sobrevivem. E porque não há palavras para tamanha desilusão, quando somente a nós se atribui tão grande culpa por tão grandes expectativas em tão pequeno ser, nós.

2 comentários:

  1. É porra da sociedade que existe, e a linda escrita que tens *

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  2. adorei, está lindo! escreves mesmo bem, gabi. gosto imenso de ti!

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